ESCALA
DE COMPULSÃO ALIMENTAR PERIÓDICA - ECAP
Com o objetivo de estudar especificamente o
comportamento do comer compulsivo, foi criada uma Escala de Compulsão Alimentar
Periódica (ECAP) por GORMMALLY, et al.
(1982), e traduzida para o português, adaptada e validada por FREITAS et al.
(2001). Esta escala consiste em um questionário auto-aplicável que avalia a
gravidade da compulsão alimentar em indivíduos obesos, em 3 medidas: sem
compulsão, com compulsão moderada, com compulsão grave.
RICCA, V et al. (2000), observam que a ECAP (BES = binge eating scale) pode ser
indicada como um instrumento "screening"
para o Transtorno de Compulsão Alimentar em pacientes obesos, e os resultados
de seus estudos confirmam a validade desta escala como um questionário de
rápida aplicação. ISNARD et al. (2003)
utilizam a ECAP para estudo com adolescentes obesos e afirmam que ela tem uma
alta consistência interna.
Ao estudar a Escala de Compulsão
Alimentar Periódica observa-se que das
16 questões que compõem a escala, 13 delas apresentam comportamentos para
critérios diagnósticos discriminados no DSM-IV. As questões 3,7,10,15 incluem
comportamentos de falta de controle no impulso para comer; a questão 6
refere-se ao sentimento de culpa ou raiva contra si mesmo em função do
comportamento alimentar; a questão 8,11 refere-se ao comportamento de comer até
sentir-se incomodamente repleto; as questões 5, 13, 14, 18 referem-se ao
comportamento de comer excessivamente mesmo sem estar com fome; a questão 2
refere-se ao comer muito rapidamente; a questão 12 trata do constrangimento de
comer demais frente a outros.
Apenas 03 questões (01, 04, 09) não
apresentam comportamentos para critérios diagnósticos discriminados no DSM-IV,
mas abordam sobre a insatisfação com o
próprio corpo pelo peso excessivo, a utilização do ato de comer para o alívio
de estados de ânimo desagradáveis, e
pensamentos obsessivos sobre o comer.
Os itens desta Escala apontam para determinantes psíquicos do ato do comer
compulsivo e consequente aumento de peso.
INVENTÁRIO DE ANSIEDADE TRAÇO -
ESTADO (IDATE)
O Inventário de Ansiedade Traço –
Estado foi proposto por Charles D. Spielberger, iniciando-se sua construção em
1964 (BIAGGIO et al. 1977). Foi traduzido e adaptado para o português, por Ângela M.B. Biaggio , Luiz Natalício e
Charles Spielberger (1977). Baseia-se
na concepção de ansiedade proposta por Spielberger (SPIELBERGER & SMITH,
1966), que distingue entre estado e traço de ansiedade.
O estado de ansiedade se refere a um estado
emocional transitório caracterizado por sentimentos subjetivos de tensão que
pode variar de intensidade todo tempo;
refere-se a uma reação a situações de stress.
O
traço de ansiedade se refere a uma disposição relativamente estável para
responder ao stress com ansiedade e uma tendência a perceber uma ampla gama de
situações como ameaçadoras. O traço diz respeito à parte da estrutura de
personalidade do sujeito. (BIAGGIO,
et al. 1977).
Apesar
de originalmente desenvolvido como instrumento de pesquisa para investigar fenômenos
de ansiedade em adultos normais (sem
perturbações de ordem psiquiátrica), o IDATE também tem mostrado ser de
utilidade para medir ansiedade em estudantes do Ensino Fundamental e Médio, e
em pacientes neuropsiquiátricos, cirúrgicos, de clínica médica, e desportistas
em geral. ( SPIELBERGER, et. al.
1966, p.1970).
O inventário é
composto de duas escalas auto-aplicáveis, com 2 componentes separados: estado
de ansiedade e traço de ansiedade. Cada escala consiste de 20 afirmações. A
escala de traço de ansiedade solicita que os sujeitos apontem como geralmente
se sentem, ou seja, identifica se a ansiedade é uma condição constante. E a
escala de estado, solicita que apontem como se sentem num determinado momento,
portanto, como a pessoa se encontra no momento em que responde ao inventário.
São impressas em caderno separado. São avaliados 5 níveis de ansiedade: 1 –
intensidade baixa; 2 – média baixa; 3 – média; 4 – média alta; 5 – alta.
Segundo
ANDRADE & GORENSTEIN (2000) o IDATE é um dos instrumentos de auto-avaliação
mais usados, e diferente de escalas como as de Hamilton, a de Zung e a de Beck que possuem construtos
semelhantes, com ênfase nos aspectos somáticos da ansiedade, o IDATE tem uma
grande proporção de seus itens medindo aspectos inespecíficos que podem estar
presentes em qualquer situação de estress.
Este instrumento tem sido usado em várias pesquisas para medir ansiedade associada com obesidade e/ou compulsão alimentar, como nos estudos de RICCA et al. (2000); NAPOLITANO et al. (2001); MATOS et al. (2002); ISNARD et al. (2003); PINAQUI et al. (2003).
PROCEDIMENTOS
A
seleção foi feita pela ordem natural de procura espontânea ao Programa de
Medicina
Preventiva da UNIMED - Baixa Mogiana, por iniciativa dos próprios adolescentes
ou de seus pais.
Cabe aqui esclarecer que o Programa de
Medicina Preventiva da UNIMED – Baixa Mogiana é um benefício oferecido pela
UNIMED aos seus usuários para atendimento de grupos de risco como obesidade e
ou diabetes infantil, adolescente e adulta; dislipidemia, hipertensão e
tabagismo. Os participantes são atendidos em grupos semanais por uma equipe
multidisciplinar de profissionais das áreas de psicologia, enfermagem, nutrição
e educação física. O período de programação para os grupos é previsto para 02 anos.
A coordenação do programa é feita por um médico cardiologista.
Este estudo tentou abranger o universo
de convivência dos adolescentes no programa, no período de 01 ano, de novembro
de 2003 a dezembro de 2004. Alguns adolescentes se recusaram claramente a participar da pesquisa, outros não
compareceram à entrevista agendada. Para aqueles que concordaram em participar,
foi solicitado que assinassem, o próprio adolescente, ou seu responsável, um
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da FCM-UNICAMP. (Anexo IV)
Inicialmente cada adolescente passou
pela triagem, feita pela enfermagem do próprio programa, onde foram colhidos os
dados relativos a idade, peso, altura, nível de escolaridade, local de trabalho
dos pais, saúde do paciente e família,
histórico clínico, presença de diabetes e taxa de colesterol, entre
outros. Também foi pesquisada a presença de outras comorbidades, entre elas
distúrbios endócrinos, pelos médicos da área. Todas as patologias médicas presentes
foram diagnosticadas por especialistas e excluídas da pesquisa.
Em
seguida os adolescentes iniciavam a pesquisa propriamente dita com a
pesquisadora. Primeiramente foi feita uma entrevista com cada adolescente,
individualmente, para se identificar o Transtorno de Compulsão Alimentar
segundo critérios do DSM IV. RICCA
et al. (2000) afirmam que a entrevista clínica é o método de
diagnóstico mais preciso para o
transtorno alimentar.
Em seguida, foram aplicadas as duas escalas:
Escala de Compulsão Alimentar e o Inventário de Ansiedade Traço-Estado. A
pesquisadora explicava o que deveria ser feito e se mantinha presente apenas
para solucionar dúvidas, se necessário, a respeito da compreensão das questões
das escalas.
Para a verificação dos resultados os sujeitos foram agrupados de acordo com a presença ou não do TCAP e pareados por idade, grau de escolaridade correspondente à idade e sexo. A partir daí as variáveis IMC e ansiedade foram comparadas em ambos os grupos para se verificar se havia diferença dos níveis destas variáveis entre eles.
Do universo
dos adolescentes que buscaram o programa de medicina preventiva no período de
01 ano, 24 deles não participaram da pesquisa por se recusarem formalmente, ou
por dificuldades de horário para a entrevista, ou não compareceram à entrevista
agendada sem apresentar explicações. Dos 81 que realizaram a pesquisa, 05
tiveram fatores de exclusão: 02 apresentaram transtornos mentais associados,
previamente diagnosticados pelo clínico;
03 deles apresentaram retardo mental, obtendo-se então, ao final, 73 sujeitos.
Embora não façam parte do grupo de
variáveis previstas para serem
avaliadas neste estudo, alguns dados integrantes ao protocolo de triagem
para a pesquisa são interessantes de serem observados, no intuito de
caracterizar com clareza a população envolvida no estudo. São eles: a
escolaridade e condição social dos sujeitos.
A escolaridade dos sujeitos pesquisados
acompanhou aproximadamente sua faixa etária correspondente: 11–12 anos para 5a.
série do 1o. grau, seguindo sequencialmente até 17-18 anos para 3a.
série do ensino médio. Desta forma, a escolaridade média destes adolescentes
acompanhou a média da faixa etária da
amostra, de 13,66 anos, o que indica escolaridade de 7a. série do
ensino fundamental.
A condição social da média dos sujeitos
da amostra pode ser observada de acordo com o trabalho dos pais, em sua maioria
comerciantes e funcionários de várias categorias de empresas da indústria e
comércio da região, e uma pequena porcentagem (6,85%) de profissionais
autônomos.
Dos
73 adolescentes pesquisados, 30 apresentaram Transtorno de Compulsão Alimentar
e 43 não apresentaram, formando o grupo-controle. A análise estatística dos
dados não mostrou diferenças significativas para idade e sexo entre os dois
grupos, com TCAP e sem TCAP, constatando-se o pareamento da amostra.
A idade média dos 73 sujeitos foi 13,66 anos,
com desvio padrão (DP) de 1,77 (Tabela no.1), o que caracteriza adolescência; e
o IMC médio do total de sujeitos foi 27,09 com DP de 3,69 o que caracteriza
obesidade, segundo a classificação de COLE et al. (2000) para adolescentes.
Em se tratando de ansiedade-estado, os níveis
mantiveram-se dentro da média para toda a amostra. Porém, para ansiedade-traço,
no grupo com TCAP os índices mostraram-se acima do nível médio - 3.
A distribuição por sexo
mostrou-se equitativa na amostra.
Tabela N° 1 –
Caracterização da Amostra Geral (N=73)
Idade
|
|
Média |
13,66 |
DP |
1,77 |
IMC
|
|
Média |
27,09 |
DP |
3,69 |
Sexo |
F |
N |
41 |
% |
56,16 |
|
M |
N |
32 |
% |
43,84 |
Grupos |
TCAP |
Média |
30 |
% |
41,10 |
|
S/TCAP |
Média |
43 |
% |
58,90 |
Ansiedade |
TCAP |
Média |
2,77 |
DP |
1,17 |
Estado |
S/TCAP |
Média |
2,26 |
DP |
1.05 |
Ansiedade |
TCAP |
Média |
3,63 |
DP |
1,30 |
Traço |
S/TCAP |
Média |
2,63 |
DP |
1,22 |
DP =
Desvio Padrão; TCAP = com
transtorno; S/TCAP= sem transtorno
Quanto a IMC
os índices mostraram-se maiores no grupo de sujeitos com TCAP que nos sujeitos sem TCAP (Tabela no2), apresentando médias e medianas
maiores. Quando comparado IMC com ECAP, o IMC também indicou índices maiores
entre os sujeitos que apresentaram compulsão alimentar, com graus mais severos
na ECAP apontando médias e medianas também maiores para sujeitos com compulsão
moderada e grave respectivamente (Tabela no.3). Em ambos os quadros é possível
visualizar que o índice de significância é menor que 0,05, o que atribui aos
resultados significância estatística representativa.
Tabela N° 2 - Médias de IMC nos grupos com TCAP e sem TCAP
Grupos |
N |
Média |
D.P |
Mínimo |
Mediana
|
Máximo |
Sem
TCAP |
43 |
27.32 |
3.84 |
21.90 |
26.67 |
36.71 |
Com
TCAP |
30 |
28.70 |
3.36 |
21.83 |
27.90 |
37.20 |
Teste de
Mann-Whitney: p-valor = 0.0346
Tabela N° 3 – Comparação de IMC com resultados da ECAP
TCAP |
N |
Média |
D.P. |
Mínimo |
Mediana |
Máximo |
G |
7 |
28,75 |
1,95 |
27,18 |
28,33 |
32,88 |
M |
32 |
28,61 |
3,62 |
21,83 |
27,98 |
37,20 |
S/TCAP |
34 |
27,03 |
3,90 |
21,90 |
26,28 |
36,71 |
Teste de Kruskal-Wallis: p-valor = 0,0426
G= TCAP
Grave; M= TCAP moderada; S/TCAP = sem TCAP
Quando se verifica o resultado da
comparação entre ansiedade – traço e IMC
por
grupo pode-se observar que tanto no grupo com compulsão alimentar
como no grupo controle, os índices de IMC, embora se mostrem maiores a partir
da média para os níveis mais elevados de ansiedade (Tabela no. 4), os índices
de correlação não são significativos estatisticamente, indicando que os
adolescentes com maior grau de obesidade não
apresentaram níveis mais elevados de ansiedade-traço, quer no grupo com
compulsão alimentar, quer no grupo sem compulsão.
Tabela N° 4 – Ansiedade –traço por índices de IMC nos grupos
Ansiedade-traço com TCAP |
N |
Média |
D.P. |
Mínimo |
Mediana |
Máximo |
|
1 |
2 |
26,65 |
0,05 |
26,05 |
26,65 |
27,25 |
|
2 |
6 |
27,17 |
3,48 |
21,95 |
27,47 |
32,67 |
|
3 |
2 |
30.88 |
2,83 |
28,88 |
30,88 |
32,88 |
|
4 |
11 |
29,25 |
2,07 |
27,18 |
28,88 |
33,30 |
|
5 |
9 |
29,02 |
4.72 |
21,83 |
28,33 |
37,20 |
|
|
|
|
|
|
|
|
|
Ansiedade-traço sem TCAP |
N
|
Média |
D.P. |
Mínimo
|
Mediana |
Máximo |
|
1 |
6 |
25,97 |
1,00 |
22,70 |
26,00 |
28,48 |
|
2 |
21 |
27,08 |
4,14 |
21,90 |
26,50 |
36,71 |
|
3 |
2 |
24,19 |
1,00 |
23,48 |
24,19 |
24,90 |
|
4 |
11 |
28,26 |
3,78 |
23.09 |
27,60 |
34,12 |
|
5 |
3 |
30,36 |
4,74 |
26,46 |
28,99 |
35,63 |
|
Coeficiente
de Correlação de Spearman
Grupo
com TCAP – p-valor= 0,2450
Grupo
sem TCAP – p-valor= 0,1253
Quanto
à ansiedade-estado os resultados
mostraram-se dentro de índice de significância estatística apenas quando
comparados por grupo, apresentando índices mais elevados no grupo com TCAP, p-valor = 0,0429 (Tabela no.5). Pode-se observar que os índices
de ansiedade-estado tiveram constância maior no grupo de sujeitos com
transtorno que no grupo – controle, indicando que os adolescentes com TCAP responderam
de forma mais ansiosa à situação momentânea de avaliação. Na comparação de ansiedade-estado com outras
variáveis, os resultados não se mostraram significativos.
Tabela N° 5 - Médias de Ansiedade-estado por grupo
TCAP |
N |
Média |
D.P. |
Mínimo |
Mediana |
Máximo |
Não |
43 |
2,26 |
1,05 |
1,00 |
2,00 |
5,00 |
Sim |
30 |
2,77 |
1,17 |
1,00 |
2,00 |
5,00 |
Teste
de Mann-Whitney: p-valor = 0,0429
Os resultados para ansiedade-traço mostraram-se diferentes de
ansiedade-estado, surgindo com escores mais altos entre os sujeitos com TCAP,
com uma média da ansiedade de 2,63;
mediana 2,00 para o grupo controle, e média 3,63; mediana 4,00 para o grupo com transtorno,
com um nível de significância bastante representativo (p-valor = 0,0017) quando ansiedade foi avaliada como uma
variável contínua (Tabela no. 5), indicando que os adolescentes que
apresentaram compulsão alimentar mostraram-se mais ansiosos enquanto traço de
personalidade que os adolescentes que não apresentaram compulsão alimentar.
Tabela N° 6 – Médias de
Ansiedade - Traço por grupo
Grupos |
N |
Média |
D.P. |
Mínimo |
Mediana
|
Máximo |
Sem TCAP |
43 |
2.63 |
1.22 |
1.00 |
2.00 |
5.00 |
Com
TCAP |
30 |
3.63 |
1.30 |
1.00 |
4.00 |
5.00 |
Teste de
Mann-Whitney: p-valor = 0.0017