SAÚDE MENTAL INFANTIL

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A QUESTÃO DA DEFICIÊNCIA MENTAL



Francisco B. Assumpção Jr.

Publicado em 20 de março de 2007


 

 

                        A QUESTÃO DA DEFICIÊNCIA MENTAL

                                   

                                                            Francisco B. Assumpção Jr.

 

 

            Somos sempre muito tentados a falar ou escrever que a questão da deficiência mental é uma mera “invenção” daqueles “ditos” normais. Entretanto, mesmo considerando que essa população seja discriminada de maneira bastante clara, acreditamos que, para termos uma visão crítica, temos que refletir, de maneira desprovida de valores prévios, essa questão.

            Quando falamos em normalidade óbviamente devemos nos ater a algum critério e esse depende do modelo que embasa nossa formação, nossa cultura e o fenômeno estudado.

            Assim, quando falamos em aspectos morais ou éticos, procuramos nos remeter a um aspecto ideal, ou seja, aquele aspecto que consideramos, a partir de nossa reflexão, como o melhor possível. Esse modelo permeia os conceitos religiosos e morais que tomam por base figuras importantes e elevadas como modelo a ser seguido.

            Quando, entretanto, pensamos sob um ponto de vista biológico, o modelo de normalidade é dado pelo estatísticamente observável. Assim, desvios dessa norma passam a ser considerados, senão patológicos, ao menos anormais. Isso porque escapam do modelo estatístico, sem nenhuma implicação valorativa, uma vez que esse desvio pode ser inclusive melhor, sob o ponto de vista adaptativo, sem no entanto fugir a essa conceituação.

            Dentro dessa abordagem é que temos que pensar a deficiência mental, definida a princípio como “uma diminuição de inteligência com predomínio adaptativo, ocorrida antes dos 18 anos de idade”.

            Se pensarmos o conceito de inteligência dentro de sua mais tradicional acepção, ou seja, como “a capacidade de resolver problemas novos” na ausência de modelos, temos que essa, por si só, já se constitue numa função fundamental para a adaptação, não somente em relação a um ambiente físico, muitas vezes hostil, mas também, e principalmente, em relação a um ambiente social extremamente exigente e baseado num sistema de desempenho e de produção.

            Em função desse embasamente criam-se mecanismos, inclusive legais, que se por um lado tem como finalidade sua proteção, uma vez que é considerado mais frágil e vulnerável, ao fazerem isso, automáticamente estabelecem uma discriminação e uma série de impedimentos que refletem exatamente essa estrutura.

            Ao analisarmos o fato somos então tentado a imaginar que a mudança legal de alguns aspectos, como a própria questão da obrigatoriedade da presença de pessoas deficientes mentais em sala de aula comum, mudasse todo um processo social de aproximadamente um milhão de anos. Esquecemo-nos assim de que, as mudanças em Saúde Mental, realizadas através de decretos legais, tem uma eficácia muito pequena, uma vez que esbarram na própria maneira de ver do grupo social, bastante ligada aos seus próprios medos, tradições e preconceitos.

            Ao fazermos, portanto, esse tipo de mudança, contribuimos muito mais para a caricaturização da pessoa deficiente, uma vez que, dentro de uma sociedade competitiva, mecanicista e pragmática, onde cada um vale por aquilo que produz, ele é colocado “em pés de igualdade” como se essa igualdade dependesse realmente desse modelo produtivo, reforçando-o e validando-o portanto.

            Acreditamos que pensar o deficiente mental em seu processo de integração não significa pensá-lo como uma reprodução do modelo social competitivo e assentado eminentemente em bases produtivas, mas sim vê-lo dentro de um contexto humanístico onde as pessoas valem exatamente por serem pessoas, independentemente de suas dificuldades e de seus problemas.

            Ver o deficiente mental dessa maneira é vê-lo portanto com seus limites e suas dificuldades sem, no entanto, deixar de considerá-lo como capaz de uma vida digna e feliz, com todos seus limites e necessidades, necessidades essas definidas e indicadas por ele mesmo e não por demanda social ou familiar.

            Assim, como qualquer ser humano, ele será aquilo que quer dentro de suas limitações e possibilidades.

            Essa será então,  a própria afirmação de sua humanidade enquanto projeto e possibilidades.

 

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