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Um álbum de Asterix sobre os direitos da criança provoca polêmica na França

Por: Anne Chemin

31 de maio de 2007

31/05/2007
Um álbum de Asterix sobre os direitos da criança provoca polêmica na França
O livro tenta tornar acessível a Convenção da ONU sobre os direitos da criança, mas crítico diz que faz uma interpretação "desnaturada"

Anne Chemin

Asterix, que tem por hábito provocar brigas, acaba de suscitar uma controvérsia inesperada em torno da Convenção das Nações Unidas sobre os direitos da criança, que foi celebrada em 1989. Para promover este texto dentro de um espírito "lúdico e pedagógico", a defensora das crianças, Dominique Versini, decidiu nesta primavera utilizar imagens do irredutível gaulês num álbum destinado a promover os direitos da criança.

Reprodução  

"Uma das minhas missões consiste em fazer com que a convenção internacional seja mais conhecida", explica a educadora. "Por ocasião dos seus 80 anos, Albert Uderzo [criador do personagem em parceria com o roteirista René Goscinny, 1926-1977] nos propôs um projeto comum dedicado aos direitos das crianças. E nós chegamos à conclusão de que as aventuras de Asterix nos permitiriam falar às crianças dos seus direitos com humor e ternura".

Mas este gesto não foi nem um pouco do gosto de Jean-Pierre Rozenczveig, que dirige a seção francesa da organização Defesa das Crianças Internacional, uma ONG fundada em 1979 com o objetivo de contribuir para a redação da convenção.

"Visão gaulesa"

Para Jean-Pierre Rosenczveig, que é o presidente do tribunal para crianças de Bobigny (região parisiense), a imagem de Asterix confere uma "visão gaulesa dos direitos da criança, pois ela ignora a realidade intercultural da sociedade francesa". Sobretudo, ela apresenta uma interpretação "desnaturada" da convenção ao fazer da criança não um ser que acede aos poucos ao pleno conhecimento dos seus direitos, e sim uma "coisinha" frágil que precisa ser protegida.

Atualmente disponível na Internet (www.asterix.com/droits-des-enfants/), o "Álbum dos Direitos da Criança" resume a Convenção em doze capítulos, ilustrados com imagens extraídas dos álbuns de Uderzo que evocam, entre outros, o direito de viver em família, ou ainda o direito de beneficiar de uma "justiça adaptada à sua idade".

Para Rosenczveig, "O Álbum" ignora "o aspecto revolucionário" da Convenção das Nações Unidas. "O texto desta Convenção foge completamente da visão clássica que se tinha da infância. Os textos dos anos 1930 eram repletos de amor e de bons sentimentos, mas eles consideravam a criança como um ser frágil que precisava ser protegido dos maus tratos, dos estupros e da desnutrição. A Convenção de 1989 afirma pela primeira vez que a criança é um ser de direito tão logo ela é concebida. Ela não pode exercer os seus direitos de imediato, mas toda a infância é dedicada a fazer com que ela tome consciência deles, permitindo que ela se prepare progressivamente até a sua maturidade. Infelizmente, esta filosofia está ausente do 'Álbum', que insiste mais na proteção do que nos direitos".

Para Dominique Versini, esta controvérsia é uma "tempestade num copo de água". "Os direitos de expressão, de reunião e de associação, que são muito importantes, estão evidentemente incluídos e enfatizados no 'Álbum'", responde ela. "As crianças conhecem muito pouco, e mal, a Convenção e o papel do defensor das crianças. Portanto, é preciso explicar-lhes essas noções, mas a Convenção é um instrumento jurídico complexo que precisa ser adaptado para que elas compreendam o seu sentido. Foi o que nós fizemos com este álbum ilustrado com o personagem de Asterix. Além disso, é preciso ir vê-las nos seus colégios, explicar-lhes o que vêm a ser esses seus direitos, dizer-lhes que elas podem se dirigir ao defensor das crianças, o que é uma maneira de ajudá-las a se tornarem jovens cidadãos".

Asterix financia os direitos das crianças

Havia, é claro, um enorme presunto na mesa de coquetel, mas a cerveja gaulesa havia sido substituída por um refrigerante de baixas calorias... Albert Uderzo comemorava os seus 80 anos, na quarta-feira, 25 de abril, no suntuoso hotel particular do Artcurial, nos Champs Elysées em Paris. Um dos presentes que ele recebeu foi um álbum-homenagem, "Asterix e seus Amigos".

Trinta e quatro desenhistas de HQs, os mais diversos - Boucq, Tibet, Loustal, Walthéry, Manara, Rosinski, Zep... - realizaram, cada um, uma ou duas páginas encenando Asterix, Obelix, Idefix e muitos outros personagens da HQ criada em 1959 pelo ilustrador Albert Uderzo e o seu amigo, o roteirista René Goscinny, misturando-os com os heróis que eles próprios criaram (Natacha, Titeuf ou Thorgal...).

As provas originais estavam em exposição no Artcurial, e vários autores estavam presentes, ao lado de Roger Carel, a "voz" de Asterix nos seus desenhos animados.

Publicado pela editora Albert-René, com uma tiragem de 400.000 exemplares na França, "Asterix e seus Amigos" já está esgotado na Espanha (30.000 exemplares distribuídos) e deverá ser também impresso na Alemanha, com uma tiragem prevista de 200.000 exemplares, segundo o seu editor.

No momento em que ele acaba de concluir o manuscrito das suas Memórias, as quais ele prefere intitular, "mais modestamente, um percurso", Albert Uderzo, o único ator das aventuras do pequeno gaulês desde a morte de René Goscinny, em 1977, aproveitou a oportunidade do lançamento deste álbum-homenagem para explicar as modalidades da parceria firmada entre Asterix e a defensora das crianças, Dominique Versini. Ele indicou que os lucros obtidos com as vendas de "Asterix e seus Amigos" financiariam o kit que a associação de defesa dos direitos das crianças irá distribuir nas escolas e nos colégios, em setembro, assim como os seus fóruns e o site que acaba de ser lançado na Internet.

"Quem melhor do que Asterix poderia falar com crianças e adultos?", comemorou Dominique Versini, enquanto Albert Uderzo acrescentou: "É um bem-feito que eu posso proporcionar. Mesmo sabendo-se que isso não passa de um grão de areia". Ainda assim, este grão pode ter um peso considerável: o mais recente álbum de Asterix, "O Dia em Que o Céu Caiu", foi vendido a 8 milhões de exemplares, dos quais 2,5 milhões na França.

Tradução: Jean-Yves de Neufville
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